sábado, 14 de julho de 2012

Mais um ponto da jornada que se vai

À mulher, ele declarou: “Multiplicarei grandemente o seu sofrimento na gravidez; com sofrimento você dará à luz filhos. Seu desejo será para o seu marido, e ele a dominará”. E ao homem declarou: “Visto que você deu ouvidos à sua mulher e comeu do fruto da árvore da qual eu lhe ordenara que não comesse, maldita é a terra por sua causa; com sofrimento você se alimentará dela todos os dias da sua vida. E o sangue que havia em Adão respodeu: Não!

Estou neste momento escrevendo da rodoviária de Marília. Marília com suas músicas Sertanejas, seus espaços e ladeiras, seu inevitável tom ambíguo entre chegada e despedida. O Sol se levantou a pouco, há umas duas horas, junto com minha saída do ultimo plantão que fiz, no Hospital Maternidade Gota de Leite. Um plantão noturno, numa sexta feira treze. Nutrido de serviço, refeições quentes, risadas, conversas sobre cinema e histórias de fantasma. São oito horas agora e ficarei aqui até as nove, na companhia de minha mochila de viagem e minha mala, dois pães de queijo e um copo de café com leite. Volto para casa dos meus pais, rotina que venho cumprindo semanalmente desde que meu pai adoeceu. Em outros tempos voltar para casa me soava algo restritivo, mas o o passar do tempo converteu essa sensação ou minha capacidade de apreende-la, numa oportunidade de mandatoriamente desvincular-se de tudo e descansar no aconchego familiar. Me aguardam la, meus pais, minha tia, meu irmão, minha namorada. Pessoas que amo e que são importantes para mim; e que pelo simples fato de existirem garantem que minha chegada seja coroada de alegria; mas não consigo partir sem levar comigo algo de tristeza pelas coisas que aprendi a amar por aqui. Talvez alguém ria de mim mas por um momento pensei em desistir da neurocirurgia e me voltar a obstetrícia. Mas a verdade é que gosto antes de tudo de ser médico e possivelmente eu seria feliz em qualquer área que perseguisse. De alguma forma eu me vinculei aquele hospital e seus funcionários e agora lamento por ir embora. Vou sentir falta da Gota de Leite, com seus corredores estreitos, escuros e algo fantasmagóricos, repletos de fotos antigas que testemunham uma fase de uma das mais antigas especialidade da medicina; da comida quente; das consultas intermináveis, do som do Cardiotocografo, dos companheiros de plantão e das enfermeira, algumas verdadeiras e sábias Midwives, com tanto tempo de casa e com tantas histórias que podem nos transportar a outra época. Fiquei parado um tempo olhando a fachada da Maternidade antes de dizer obrigado mais uma vez e ir embora. Essa parece ser a lei que governa a existência de um homem. Caminhar, agradecer e seguir em frente, errante até que não tenha mais pernas para caminhar e braços para trabalhar, e em sua última restrição; pela mão de seus pares e entes queridos, seja devolvido ao aconchego e aos braços de sua família.